segunda-feira, 22 de agosto de 2011

O Resgate do Irmão Desconhecido

Galopes. Memórias. Ressentimentos.

“Tenho uma missão para você. Missão de total sigilo.”

“Desde quando paladinos trabalham em sigilo?”

Terra batida. Árvores. Estrada.

“Um dos nossos foi raptado.”

“Por que não uma equipe de resgate?”

Armadura. Escudo. Martelo.

“Porque ele foi capturado em território inimigo e qualquer atividade poderia ser motivo para guerra.”

“O que um dos nossos estava fazendo em território inimigo?”

Acampamento. Sentinela dormindo. Investida.

“Cumprindo ordens minhas... E agora, nem sei se ele está vivo.”

“As ordens foram tão vergonhosas que você não pode nem me contar?”

Um comando com os calcanhares. Mais velocidade. Martelo erguido.

“Que os deuses me perdoem.”

“Sim, que os deuses te perdoem. Porque eu não perdôo.”

A cabeça do primeiro robgoblin estourou antes que ele acordasse com o impacto do martelo enquanto Barão, meu cavalo, pulou para o meio do acampamento. Fiz com que uma tocha dos inimigos caísse em uma das cabanas, iniciando um incêndio e, ao mesmo tempo, o caos. Estanquei Barão no meio das cabanas em fogo e eles vieram.

Os primeiros empunhavam apenas espadas e machados, sem nenhuma proteção, sendo alvos fáceis. Um tentou me atacar e teve sua arma espatifada pela minha e uma têmpora afundada. O segundo teve seu golpe bloqueado e a mandíbula arrancada pelo meu escudo que desceu em sua boca. Senti Barão se agitando e ouvi o coice no terceiro infeliz.

Um robgoblin com, provavelmente, mais de dois metros de altura surgiu em meio ao acampamento em chamas com um prisioneiro acorrentado sendo jogado no chão. Desmontei do meu cavalo.

- Renda-se ou mataremos o humano.

- Entregue-o, ou todos morrerão.

O líder riu. Mais cinco surgiram por todos os lados, bem equipados e aguardando ordens.

- Já matei quatro, acha mesmo que vale a pena perder todo o resto por causa de um humano?

- Acho que vale reportar o ataque ao meu rei e começarmos uma guerra.

- É? Típico de um covarde!

Seu humor sumiu com o insulto. Dois robgoblins seguraram o riso ao ver o comandante sendo afrontado. O líder segurou a corrente com mais força e franziu as sobrancelhas enquanto me encarava.

- Você será levado junto ao outro humano, com a diferença que não terá mais língua até o final desta noite.

- E de nada mais servirá a sua língua, pois, de que valem as palavras de um covarde? – insisti na bravata. - Há quanto tempo seus soldados seguem suas ordens e você não faz nada? Cada um deles me parece mais capacitado do que você. Deve ser terrível ter um comandante fraco e covarde.

Os robgoblins pararam de me observar e depositaram sua atenção ao líder – morderam a isca.

- Você fala demais! Soldados! Arranquem a língua dele!

E nenhum esboçou reação.

- Soldados! O que estão esperando? Aqueles que não obedecerem terão a língua cortada também! É isso que querem? Andem! Obedeçam!

Dois seguraram o cabo das armas, mas esperaram por alguma reação dos outros. O grupo não tinha moral.

- Lhe farei um favor – disse erguendo meu martelo. – Prove aos seus soldados que é forte. Derrote-me e quem sabe eles voltam a obedecer?

Ele rosnou, ergueu a sua espada e investiu. Tudo que eu queria.

Quando se aproximou, girei meu martelo e acertei seu escudo, espatifando-o, e dei outro giro. Enquanto os restos de metal se espalhavam pelo ar, acertei um segundo golpe em seu ombro, fazendo seu osso ranger e estalar, inutilizando seu braço. O robgoblin rugiu. Tentou golpear com o seu braço restante, mas sua dor o desconcentrava. Pulei para trás evitando a primeira espadada, girei para o lado, esquivando a segunda, e bloqueei a terceira com o escudo.

Focalizei minha fé em meu punho. Ergui meu martelo. Rezei. Robgoblins não costumam acreditar em milagres, mas presenciaram um. Minha arma emanou luz própria, canalizou a força de meu deus até meu braço vibrar espontaneamente, sentindo a energia circular. E, então, desceu de encontro ao tórax do líder, arremessando-o no chão, esmigalhando seu peitoral metálico.

Estava morto. Seu peito estava côncavo e escorria-lhe sangue pelos ouvidos e pelo nariz. Olhei para os restantes.

Nenhum deles havia parado para pensar na consequência de perder o líder e, agora, simplesmente não conseguiam pensar. Poderiam atacar, poderiam fugir, poderiam simplesmente sentar e chorar. Eu não iria esperar para ver.

- Barão!!!

Meu cavalo veio, atropelou e pisoteou um dos inimigos. Meu martelo afundou um crânio e partiu uma coluna vertebral. Dos dois que sobraram, um atacou e o outro correu. Típico.

Bloqueei um ataque de machado com meu escudo e, no mesmo movimento, empurrei o atacante. Ele pensou que eu estava apenas o evitando, preparou outro golpe, mas recebeu um coice em suas costas que o empurrou de volta. Recebi o robgoblin com um golpe de martelo, fazendo seu pescoço torcer, desconjuntado.

Procurei pelo ultimo sobrevivente e o vi correndo longe, quase saindo do acampamento. Pensei em montar em Barão e persegui-lo floresta a fora, mas, entre uma cabana em fogo e outra, um humano pulou em cima do fugitivo, derrubou-o no chão, enroscou suas algemas no pescoço do inimigo e tratou de enforcá-lo ali mesmo.

Fui até os dois sem pressa, assistindo ao assassinato do último inimigo pelas mãos do homem o qual eu viera resgatar. Quando a vítima amoleceu, ele soltou as correntes e se deixou cair no chão, ofegante. Estava magro e pálido, com cicatrizes pelas costelas e costas. Estendi minha mão.

Ele segurou e ficou de pé. Mesmo sem armadura e vestindo trapos, a postura de um paladino é inconfundível. Quase morrera para honrar uma ordem de um superior e, provavelmente, acreditara que seria largado aos goblinoides. Agora, estava de frente a outro cavaleiro e sabia que viveria.

Homens honrados se reconhecem. De certa forma, fiquei feliz em ver que aquele desconhecido sobreviveria. Um homem de valor estava a salvo e salvaria mais vidas depois daquele evento. Poderíamos dizer mil coisas, mas ele decidiu resumir tudo, estender a mão e dizer:

- Obrigado.

2 comentários:

  1. Supondo a hipótese da reencarnação, começo a suspeitar de que seus textos não sejam apenas frutos da imaginação - mas recordações do período em que você viveu na idade média! Acredito que tenha até participado de reuniões em torno da Távola Redonda! Parabéns!!!

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  2. Bem detalhista como sempre fazendo com que o leitor sinta-se dentro do conto a cada cena de ação!

    Senti falta de nomes isso é verdade...

    Gostei do conto e quero ver a continuação dele e de outros =)

    Parabéns, beijão.

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